Morada dos bem-aventurados

Revista Espírita, outubro de 1860

(Médium, senhora Costel.)

       Falemos das últimas espirais de glória habitadas pelos puros Espíritos. Ninguém as alcança antes de ter atravessado os círculos dos Espíritos errantes. Júpiter é o mais alto grau da escala; quando um Espírito, por longo tempo purificado pela sua permanência nesse planeta, é julgado digno da suprema felicidade, é advertido por um redobramento da energia; um fogo sutil anima todas as partes delicadas de sua inteligência que parece irradiar e se tornar visível; ofuscante, transfigurado, ele ilumina o dia que parece tão radioso aos olhos dos habitantes de Júpiter; seus irmãos reconhecem o eleito do Senhor e, trêmulos, se ajoelham diante de sua vontade. Entretanto, o Espírito escolhido se eleva, e os céus, em sua suprema harmonia, lhe revelam belezas indescritíveis.   

        À medida que ele sobe, compreende, não mais como na erraticidade, não mais vendo o conjunto das coisas criadas, como em Júpiter, mas abarcando o infinito. Sua inteligência transfigurada se lança como uma flecha para Deus, sem estremecimento e sem terror, como num foco imenso alimentado por milhares de objetos diversos. O amor, nesses diversos Espíritos, reveste a cor de sua personalidade experimentada; eles se reconhecem, se regozijam uns pelos outros. Suas virtudes, refletidas, repercutem, por assim dizer, as delícias da visão de Deus e aumentam incessantemente a felicidade de cada eleito. Mar de amor que cada afluente engrossa, essas forças puras não permanecem mais inativas do que as forças de outras esferas. Investidos logo do dom da ubiquidade, eles abraçam, ao mesmo tempo, os detalhes infinitos da vida humana desde a sua eclosão até as suas derradeiras etapas. Irresistível como o dia, sua visão penetra por toda a parte ao mesmo tempo, e, ativos como a força que os move, eles espargem as vontades do Senhor. Como de uma urna cheia se escapa a vaga benfazeja, sua bondade universal aquece os mundos e confunde o mal.

        Estes diversos intérpretes têm por ministros do seu poder os Espíritos já depurados. Assim, tudo se eleva, tudo se aperfeiçoa, e a caridade irradia sobre os mundos que ela alimenta como seu poderoso seio.

        Os puros Espíritos têm, por atribuição a posse de tudo que é bem e verdade, porque possuem Deus, o próprio princípio. O pobre pensamento humano limita a tudo o que ele compreende e não admite o infinito que a felicidade não limita. Depois de Deus, que pode aí haver? Deus ainda, Deus sempre; o viajante vê os horizontes sucederem aos horizontes e um não é senão o começo do outro; assim o infinito se desenrola incessantemente. A alegria mais imensa dos puros Espíritos é precisamente essa extensão tão profunda quanto a própria eternidade.

        Não se pode descrever uma graça, uma chama, um raio, não posso descrever os puros Espíritos. Mais vivos, mais belos, mais brilhantes que não o são as imagens mais etéreas, uma palavra resume seu ser, seu poder e suas alegrias: Amor! Enchei desta palavra o espaço que separa a Terra do céu e não tereis ainda senão a ideia de uma gota d'água no mar. O amor terrestre por grosseiro que seja, só pode vos fazer conhecer a sua divina realidade.

GEORGES.

Allan Kardec  -  Revista Espírita de outubro de 1860

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